Tolerância tem limite

Em muitos episódios históricos já ficou demonstrado que a tolerância com os desmandos de pessoas e/ou grupos organizados trouxeram consequências nefastas para a convivência harmônica da sociedade. Esses agentes, normalmente guiados por visões fundamentalistas do mundo, querem impor a sua filosofia, e para isso, usam de todas as formas de persuasão. Começam quase sempre pelo convencimento através de um discurso raivoso e vazio. Com o passar do tempo, vão escalando para a agressão verbal e chegando às raias do absurdo de fazerem ataques violentos, com total desprezo pela integridade física daquele que não concorda com suas ideias.

A intolerância é uma atitude mental caracterizada pela falta de habilidade ou vontade em reconhecer e respeitar as diferenças em crenças e opiniões. Num sentido político e social, intolerância é a ausência de disposição para aceitar pessoas com pontos de vista diferentes.”

Aí está o “X” da questão: Se um indivíduo não consegue conviver com a diversidade, é necessário que essa mesma sociedade imponha limites ao seu comportamento. Para isso existem as regras escritas e aquelas oriunda dos costumes.

A liberdade de expressão e de comportamento são os pilares de uma sociedade democrática. Permite que todo e qualquer cidadão se expresse da forma que lhe aprouver e viva como achar melhor. Para acomodar essa diversidade de pensamentos e ações, deve-se então, o conjunto da sociedade, exercer de forma concreta outra premissa imprescindível: a tolerância. Esse comportamento amistoso, norteará a capacidade de ouvir, respeitar e analisar as opiniões divergentes.

Ocorre que o problema se agrava quando essa divergência tem como cortina de fumaça a intolerância. Quando em nome de valores e preconceitos, pregam a segregação de determinadas etnias, como os indígenas, ou incitam a punição de outros por sua orientação sexual, cor da pele ou classes social. Nestes casos, a sociedade deve se posicionar, usando dos freios e contrapesos criados para isso.

O filósofo austro-britânico (nasceu em Viena e naturalizou-se britânico) Karl Popper (1902-1994), já dizia: “A tolerância ilimitada leva ao desaparecimento da tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada mesmo aos intolerantes, e se não estivermos preparados para defender a sociedade tolerante do assalto da intolerância, então, os tolerantes serão destruídos e a tolerância com eles.”

Não se deve impor a ninguém o cerceamento do seu direito de expressão e de modo de vida, desde que esse comportamento respeite a liberdade e o direito do outro. Outro ponto a ser observado, é que essa liberdade de expressão e esse modo de ser não pode afetar o “modo de vida” da sociedade como um todo. As mentiras, o engodo, a deturpação da verdade, precisam ser combatidas.

Quando o estado se omite, quando a sociedade é convivente, ou mesmo não o sendo, aceita conviver com a intolerância, as consequências são muito grandes. O mundo está cheio de resultados nefastos patrocinados pela intolerância: A segregação racial enfrentada por Martin Luther King que custou sua vida. Os anos de prisão enfrentados por Nelson Mandela contra o apartheid na África do Sul. O sacrifício de Zumbi dos Palmares em sua luta pela liberdade dos escravos.

Atualmente, a intolerância é muito mais difusa. Na maioria das vezes não existe uma causa, mas sim um preconceito generalizado, enraizado em grande parte da sociedade. Não se tolera o índio viver na floresta, ocupando grandes extensões territoriais, mas é complacente com um latifundiário que ocupa sozinho mais terras que uma tribo inteira. Qual a razão para o preconceito? O índio não produz. Ora, qual é o conceito de produção para justificar essa intolerância? Nenhum. O índio é originário, ele usa a terra como instrumento de sua sobrevivência.

Não se tolera a relação homoafetiva, que às vezes é muita mais sólida que pessoas que não conseguiram se ajustar em 03 ou 04 casamentos. O preto não pode galgar posições de destaque, pois na visão dos intolerantes eles não merecem essa ascensão social. O pobre é obrigado a conviver com serviços de baixa qualidade porque é isso que eles podem pagar.

Enfim, são justificativas inaceitáveis. O pior é quando o estado, ou a sociedade, toleram esses comportamentos e ainda subsidiam pessoas e grupos que militam nessa esfera. É o caso de políticos e associações que pregam e exercitam a intolerância. Todos os dias a imprensa noticia caso de presidente, governador, senador, deputado, prefeito, vereador, que incitam a violência, praticam a discriminação e humilham os menos favorecidos.

Esses agentes públicos vivem das benesses do estado, com privilégios e verbas bancadas pelo imposto de cada um, discriminado ou não. Os partidos políticos recebem verbas públicas, e por isso tem o dever de excluir esses indivíduos de seus quadros. Os homens e mulheres de bem, que são a maioria, deveriam ser ágeis para punir esses elementos. Leis existem, bastam que sejam aplicadas. Cassar o mandato desses políticos que dão mau exemplo é a primeira providência. Exigir que intolerantes e preconceituosos sejam expurgados de funções públicas é o mínimo que deve ser feito.

A lei deve ser aplicada como prevê o direito. Sem olhos e nem ouvido, mas com o principio da justiça e da equidade. Não se pode tratar um morador da periferia diferentemente de um abastado da zona sul, quando os direitos fundamentais devem ser respeitados para todos. Não se deve “matar” um favelado, ou mesmo um delinquente pobre e tratar com deferência um bandido rico. Ser tolerante com alguém que prega a desunião, a destruição dos preceitos e valores de uma sociedade justa e igualitária é contribuir com a destruição do marco civilizatório que a sociedade construiu ao longo do tempo.

 

 

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