Transição, do latim transitio, é a ação e o efeito de passar de um estado para outro, diferente do anterior. O conceito implica a mudança na forma de ser ou de estar. Usualmente concebida como um processo temporal, indicado para mudar as coisas de lugar ou de trocar um “status quo” por uma situação nova.
É muito comum nas grandes empresas, quando a performance das ações ou o resultado não agrada aos acionistas. Então troca-se o comando e faz-se a transição entre o antigo gestor e a nova equipe. Da mesma forma, na política moderna, adotou-se o conceito e ação de fazer a transição de governo. Antes, quando terminava uma eleição, o novo mandatário assumia o poder no dia determinado, sem nenhuma informação do governo precedente. O novo incumbente passava meses para entender o funcionamento da engrenagem, perdendo tempo, dinheiro e as condições de aproveitar o início do mandato para implementar novas ações.
Com a criação do processo de transição, moderado por lei, até mesmo ferrenhos adversários são obrigados a conviver num processo de troca de informações. Se não por eles, através de prepostos indicados para tanto. No entanto, esse ato formal, que deveria permear as futuras ações, não passa de mera coreografia, já que existe uma pré-disposição de não dar crédito às ações do antecessor.
A transição deveria ser usada pelos chegantes, para conhecer todos os processos utilizados e valorar uma escala de prioridades. Aperfeiçoar o novo modo de operar, sem desqualificar as ações daqueles que estão se retirando. Não deveria ser uma ruptura. Ocorre que comumente, principalmente na política, ou seja, na gestão estatal, o mantra é esquecer o que foi feito pelo mandatário anterior, não importando se bons ou maus projetos. Deve se mudar tudo, para continuar do mesmo jeito.
Essas atitudes comezinhas e imediatistas seriam menos prejudiciais se houvesse uma legislação voltada para políticas de estado e não de governo. Projetos a serem implantadas para o bem da sociedade. Na área de educação, saneamento básico, segurança e saúde, através de leis impositivas, sob pena de responsabilização civil e criminal.
É uma evolução necessária do ponto de vista social. Nesta sociedade globalizada em que vivemos, as demandas são cumulativas, ou seja, não se esgotam por si mesmas. A população está cada vez mais vulnerável, seja pelo recrudescimento da violência ou pelo aparecimento de novas doenças. A fome, o desemprego e a falta de escolaridade não retroagem. Em face disso, é absolutamente necessária a implantação de políticas de médio e longo prazo no sentido de atender essas carências.
Por outro lado, é da mesma forma importante, aproveitar esse momento para analisar outro termo comumente usado e que deveria exercer forte influência no comportamento e nas ações dos indivíduos: do verbo latino transigire, a transigência significa o ato de ceder para chegar a um acordo, conciliar, acomodar.
O Brasil carrega uma forte tradição de conciliação. Não deixou de travar suas guerras, mas no fundo o espírito conciliador sempre prevaleceu. Mesmo quando os desmandos duraram décadas, impingindo sacrifício de vidas, como no caso da ditadura militar, não houve a punição dos responsáveis, mas sim, um grande acordo nacional para anistiar tudo e todos.
Para evoluir como sociedade, devemos aprimorar o sentido da conciliação, ou transigência.
Aplicar a transigência de forma rasa e irresponsável, talvez seja a raiz de nossos problemas. Conciliar, acomodar, ajustar, conceder, perdoar, não pode ser traduzido em impunidade. A lei existe para todos, e se alguém cometeu ilícitos, além do mais quando os comete conscientemente, esse individuo deve ser punido. Na forma prevista em lei. Com o garantido direito de defesa e do contraditório, mas nunca sem responder por suas atitudes.
Devemos nos orgulhar de sermos chamados de povo ordeiro, conciliador, mas abandonar de vez o tal “jeitinho brasileiro”. Principalmente para criminosos. Tem-se por aqui, a falsa impressão de que crimes pequenos não devem ser punidos. Esse comportamento deve ser banido da nossa sociedade. Crime é crime, não importa o tamanho. Se maior ou menor, a dosimetria da pena vai estabelecer a punição.
O momento atual é de transigir.
Tolerar opiniões divergentes, aceitar posicionamentos contraditórios, mudar a forma e o entendimento sobre como agir em sociedade. Entender que as minorias devem ser respeitadas e promovidas. Que o estado existe para dar condições de igualdade a todos.
Devemos fazer a transição.
Mudar no sentido de melhorar. Mas devemos sim, transigir da forma correta. Tolerar e acolher todas as correntes de pensamento, mas não compactuar com o crime e a intolerância.
A justiça deve ser igual para todos, independente da posição política ou classe social. Crimes foram e estão sendo cometidos no Brasil. Seja pela inoperância das autoridades, seja pelo incentivo ao desrespeito às leis. Milhares de vidas foram perdidas. Famílias inteiras destruídas e os responsáveis precisam ser responsabilizados. As instituições estão sendo atacadas, enfraquecidas e desmoralizadas, e esse comportamento não pode ser tolerado.
O Brasil não precisa de novas leis. Basta que os agentes públicos, investidos de autoridade e pagos com imposto de todos os brasileiros exerçam o seu dever. Imputem aos responsáveis pelos desmandos, pela inobservância das leis, as penas previstas de acordo com o ordenamento jurídico e os preceitos da nossa constituição. Tudo isso deve ser feito observando a transição ordeira da tolerância, para a intransigência com a ilegalidade e a impunidade.
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