O livro sagrado nos traz a seguinte mensagem: “Podes escolher segundo tua vontade, porque te é dado” (Moisés 3:17). Assim, entendido como livre-arbítrio, é a capacidade que o ser humano tem de tomar decisões por conta própria, de escolher como agir e como se comportar. Por outro lado, o neurocientista Benjamin Libet, afirma que o ser humano é incapaz de decidir por si mesmo. Segundo ele, o cérebro toma decisões automaticamente, dependendo da forma como é estimulado.
Willian Shakespeare, em sua tragédia Júlio César, evidencia esse contraponto entre o livre-arbítrio e a incapacidade do homem em escolher. Enquanto Brutus hesita em participar da morte de seu melhor amigo, Cassio procura induzi-lo à ação. Seu discurso contem a mais célebre defesa do livre-arbítrio encontrada nos livros: “Há momentos, diz ele, em que os homens são donos do seu fado. Não é dos astros, caro Brutus, a culpa, mas de nós mesmos, se nos rebaixamos ao papel de instrumentos”.
Em uma época degradante, onde a intolerância permeava a existência de grande parte da humanidade, uma jovem polonesa foi colocada de frente a um desafio imensurável: escolher quais dos filhos (ela tinha um casal), seria entregue aos nazistas para morrer na câmara de gás. Essa história se transformou em livro, filme e povoou a mente de milhões de pessoas ao redor do mundo. O que levou Sofia a ficar de frente com essa ignóbil decisão? Nenhuma razão lógica, mas tão somente a sordidez de caráter de um oficial nazista. Para ela, qualquer decisão que tomasse seria cruel e mudaria sua vida para sempre.
Muito tempo antes, outro personagem bastante conhecido, Pôncio Pilatos, teve que fazer uma escolha: libertar Jesus ou condená-lo à morte e ser crucificado ao lado de dois ladrões. Seu crime foi juntar as pessoas e falar sobre uma nova forma de viver: com amor, tolerância e aceitação. Isso incomodava alguns privilegiados. Pilatos tinha o poder de negar, mas diante da pressão vinda desses grupos, lavou as mãos. Tivesse ele libertado Jesus, a história da humanidade, do cristianismo, seria contada de forma diferente.
O presidente Harry S. Truman colocou seu nome na história pela escolha feita diante do problema que lhe foi apresentado: invadir o Japão, ao custo de incontáveis vidas americanas e de aliados, ou jogar sobre os japoneses um artefato nuclear arrasador? Sua escolha foi um divisor de águas no enfrentamento das guerras. O mundo conheceu a mais terrível arma de destruição em massa, até então criada. Morreram 140 mil pessoas em Hiroshina e mais de 80 mil em Nagasaki, instantaneamente. Presumem os cientistas, que até hoje existem sequelas desse acontecimento.
Mahatma Ghandi poderia ter optado por incitar a violência na luta pela independência da Índia, entretanto, ele escolheu liderar seu povo pacificamente no enfrentamento dos colonizadores ingleses. Sua atitude incentivou movimentos pacifistas, e inseriu a sociedade civil como uma potente arma, na construção de soluções para um povo e para uma nação.
Getúlio Vargas foi um líder incontestável. Governou o Brasil por quase 20 anos, iniciando-se na década de 1.930 até o suicídio em 24 de agosto de 1.954. Nesse período foram muitas formas de governar, (nomeação, ditatura, eleição) e muitas crises. Na pior delas, sua escolha foi a morte. Essa atitude levou o país a maiores convulsões sociais e políticas, desaguando na ditadura que durou 21 anos.
O Brasil, experimentou nas últimas 03 décadas de estabilidade institucional expressivo crescimento. Industrial, tecnológico e social. O país se transformou numa complexa economia globalizada, colocando seus produtos ao redor do mundo e trazendo para cá inovações tecnológicas de primeira linha. Ainda assim, é presença constante nas piores estatísticas quando se fala em distribuição de renda e desigualdade social. O país tem instituições fortes e um povo trabalhador. Carece, entretanto, de lideranças políticas sérias e confiáveis.
Mas nada está perdido. Precisamos tomar consciência da enorme responsabilidade sobre nossos ombros (ou sob nossos dedos). Este é um momento crucial de nossa história. Somos um povo pacífico e ordeiro, mas que às vezes toma decisões importantes sem levar em conta as consequências. E este é o momento de escolher o nosso destino. Habitamos um país divido. Não por fronteiras geográficas ou por etnias e religiões. Mas sim, pela intolerância que está chegando às raias do absurdo. As pessoas estão se matando por discussões tolas, impregnados pela ideologia da violência, da segregação e da inclemência.
E nesse momento precisamos fazer nossas escolhas. Não como a de Pilatos, que saiu pela tangente. Não como a de Sofia, onde qualquer escolha era a pior possível. Precisamos escolher entre a possibilidade de seguir em frente com o mínimo de decência e compostura, aprofundando o marco civilizatório que já construímos, ou continuar regredindo para a insensatez e a barbárie que estamos vivendo.
Boa escolha!!
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