Reflexo no Espelho

 

            “Toda nação tem o governo que merece”. A frase que entrou para a história, dita pelo filósofo francês Joseph de Maistre, (1753-1821), parece atual 250 anos depois. Considerando o termo “stricto sensu”, poderemos fazer uma leitura superficial do pensamento filosófico, replicando-a para o tempo presente e consequentemente para a realidade em que vivemos. O escritor não era partidário da participação popular na escolha dos governantes, pois defendia o regime monárquico, entretanto, se essa fosse a opção, o povo deveria pagar pela má escolha dos seus representes. Segundo ele, se o eleitor não sabia usar seu direito de voto para uma boa escolha, merecia ser punido por isso.

Muito se fala que o brasileiro não sabe votar. Que não valoriza esse direito consagrado constitucionalmente, usando-o de forma leviana e até mesmo irresponsável. Democracias até pouco tempo exemplares, como os Estados Unidos, também viraram tema de teses e estudos sobre a incapacidade que tem o eleitor de fazer uma boa escolha. Colocar a questão como a escolha entre o bem e o mal, o certo e o errado, o melhor ou o pior não ajuda a entender o processo civilizatório.

Existem formas de governo, regimes e representações para todos os gostos. Em cada país o modo de governar obedece a uma dinâmica civilizatória. O sistema vai se aperfeiçoando, com avanços e retrocessos moldados pelas forças sociais, e quase sempre representam o desejo de uma maioria. Essa maioria é forjada através das demandas que a classe dominante atende ou deixa a desejar. Dai surgem os movimentos populares, as revoluções e as mudanças através do voto.

Credita-se a Winston Churchill a célebre frase: “a democracia é o pior regime, exceto todos os outros”. Não é difícil concordar com o grande líder inglês. Na democracia o povo escolhe seus representantes de forma livre e democrática, exercendo o inalienável direito ao voto secreto e universal. Alguém pode dizer que existem votações fraudulentas, mas aí não estamos falando de democracia, mas de regimes disfarçados de democracia.

É nesse ponto que a questão se torna complexa e nos remete à frase do tópico. No caso, não é merecer o governo, mas entender como essa escolha é feita. A sociedade, desde os primórdios de sua história, nunca quis segurar as rédeas do seu destino. É mais cômodo delegar as diretrizes para um condutor. É melhor colocar as decisões e os resultados nas mãos dos outros do que assumir o ônus de levar adiante as próprias escolhas.

Em face disso, fica fácil para os manipuladores e espertalhões, conduzir o processo. O povo vota de acordo com a mensagem que o seu inconsciente capta. A verdade, a mentira, o certo e o errado são peculiares para cada um. O ser humano é influenciável, gosta de estar sob o “efeito manada” e seguir na linha cinzenta do coletivo. As escolhas são feitas pela proximidade. O homem ou a mulher não se relacionam com um desconhecido. Eles se casam com alguém que eles conhecem.

Assim é a política. O eleitor vota naquele que mais se parece com ele. Mesmo que não o conheça pessoalmente, ele se identifica com aquele político que fala a linguagem que ele entende, que se expressa como ele ou seus amigos e responde aquilo que ele responderia. É um dos seus representando a maioria.

Essa é a realidade do Brasil. O brasileiro médio, sente-se representado por elementos toscos, incultos e sem retórica erudita, porque se vê refletido no espelho nestas figuras. Eles não se interessam pelo crescimento do PIB, pela taxa de câmbio, pelo “spread” bancário ou pelas pautas de costumes. O brasileiro é liberal, participativo e progressista. Ao mesmo tempo é pobre, estudou pouco e não quer se aprofundar em temas complexos. Ser de esquerda ou de direita não é a questão. O brasileiro médio, que a imensa maioria dos eleitores, é de centro, mesmo sem saber o que é isso. Ele não gosta de extremos. Ele quer viver em paz e tocar sua vidinha sem complicações.

Por isso, quem melhor fizer chegar essa mensagem ao seu intelecto, será o escolhido. Se não der certo, ele muda de novo, pois não existe em sua consciência fidelidade programática ou filosófica, mas sim uma empatia moldada pela mensagem de proximidade e de condução do seu destino, com a consequente solução de suas demandas imediatas: comer, trabalhar e viver relativamente em paz. O resto deixa pra resolver depois.

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